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Alves superou 'humilhações' e recusa do Santos para brilhar no São Paulo

do UOL

Matheus Alves, em relato ao repórter Eder Traskini

Do UOL, em São Paulo (SP)

22/05/2025 05h30

Eu me lembro de estar na escola quando aconteceu. Naquela época, a aprovação nas peneiras saía no site. Eu já tinha ado na primeira e saiu a relação da segunda.

Na escola em que eu estudava, todos jogavam no Santos, seja futsal, como eu, ou campo. Corremos para ver. Quem tivesse ado, só teria mais uma avaliação antes de ser oficialmente aprovado. Mas o meu nome não estava ali. Todos tinham ado, menos eu.

Saí dali antes que as lágrimas caíssem dos meus olhos. Liguei para o meu pai e desabei. Chorei escondido o dia todo. Não conseguia ficar na sala, ia no banheiro a todo momento para esconder o choro. Quando cheguei em casa, estava completamente abalado.

Eu soube depois que não me aprovaram porque me chamaram de 'peladeiro'. Sabe? Diziam que eu queria fazer as coisas do futsal no campo, que não tinha objetividade, que dava chapéu e caneta para trás e, por isso, meu estilo era mais para o futsal. E, naquela época, talvez fosse. Mas isso não quer dizer que a dor não tenha sido enorme.

Eu tinha 11 anos. Por mais que tenha doído, eu não pensei em parar. Aquilo era a única coisa que eu gostava de fazer. Fui arrumando força no dia a dia, mostrando pra mim mesmo que eu conseguia, que eu não era aquilo que eles estavam falando.

Eu ia mostrar pra todo mundo que eu ia dar certo. Mas antes disso, eu tive que ar por muitas provações, humilhações e até lesões. Eu sou o Matheus Alves e talvez seja hora de você conhecer a minha história.

Matheus Alves São Paulo - Marcello Zambrana/AGIF - Marcello Zambrana/AGIF
Matheus Alves, jogador do São Paulo, durante jogo contra o Santos no Brasileirão
Imagem: Marcello Zambrana/AGIF

O começo e o sacrifício

Eu jogava futsal no Santos desde os 7 anos. Cheguei quando nem existia a categoria ainda e fui do primeiro time criado. Eu nasci em São Vicente e comecei nas escolinhas com 5 anos: no Tumiaru e no Premiere.

Os professores começaram a dizer que tinha algo diferente em mim e me levaram para o Portuários. Eu já tinha disputado regionais, mas foi no Portuários meu primeiro torneio da federação. Não demorou um ano para o Santos me ver e me levar para o futsal deles.

Eu ficaria no Santos até os 13 anos jogando nas quadras, mas desde os 11 eu comecei a atuar no campo pelo São Paulo, logo depois de ter sido rejeitado pelo Santos.

Eu joguei uma partida contra o São Paulo do treinador Rodrigo Cabral no futsal e ele estava indo para o campo. Ele fez uma seleção com os melhores atletas de times que atuavam contra ele e chamou para jogar no campo.

Só que eu não tinha condições financeiras de subir a serra pra treinar em Cotia. No começo, tinha um menino que treinava no futsal do Santos comigo que também tinha sido chamado, o Nicolas. Nossos pais conversaram e eu ia com ele.

Meu pai levava comida no carro pra gente almoçar no caminho pra dar tempo. Saía da escola mais cedo e mesmo assim chegava atrasado no treino. A gente fez isso duas vezes por semana durante um ano e meio. Só que aí, o Nicolas saiu.

Foi difícil. Meus pais não tinham condições. Eles começaram a pegar dinheiro emprestado para conseguir me levar, pegavam o carro emprestado de algum familiar ou amigo... Meus pais fizeram muitos sacrifícios por mim.

Saía da escola 12h30, chegava no treino 14h e voltava pra casa 18h30. Meu pai comia alguma coisa e ia trabalhar para no outro dia fazer a mesma coisa. Isso quando não pegávamos algum problema na estrada. Uma vez, a entrada de Santos estava alagada e ficamos parados até de madrugada dormindo no carro até conseguirmos atravessar.

amos por muitos perrengues e muita humilhação para que eu esteja onde estou hoje.

O campo, a lesão e a promessa

Quando eu completei 14 anos, eu poderia me alojar em Cotia e, para isso, tinha um teste. Eu já jogava pelo São Paulo desde os 11, mas ainda assim tinha esse teste que era de basicamente uma semana. O que aconteceu? Me machuquei no segundo dia.

Mano, vocês não têm noção. Era muito moleque no teste. Tipo uns 90 meninos. Eles usavam todos os campos, todos os dias para os jogos. Eram dois jogos por dia.

Começou e estava aquela loucura, né? Jogos de um tempo só, muito rápido. Se não mostrasse ali, já era. Consegui ir bem nos dois dias. Só que eu fui driblar o goleiro, deixei o pé de apoio e ele pisou no meu tornozelo. Já era.

Ali, falei: 'Não é possível'. Deu um medo enorme, mano. Falei: 'Se não ar, moiô'. O técnico já me conhecia, então tive sorte. Mas mandaram de volta pra casa e falaram que iam ligar.

Nesse momento, eu já tinha abandonado o Santos. Eu e meu pai conversamos e decidimos que eu precisava optar: futsal ou campo. Na época, eu me saía melhor no futsal, mas o que iria me dar futuro seria o campo e eu tinha que me adaptar o quanto antes. Falei pra ele: 'Pai, eu quero mudar a sua vida e a da mamãe. Para isso, eu preciso me sacrificar no campo'.

Então, imagina você: eu tinha acabado de me decidir pelo campo, fui fazer o teste para alojar e continuar jogando no campo e me lesiono no segundo dia.

Bom, falaram que iam ligar, então voltei pra casa e esperei. Foi difícil. Minha mãe perguntava para as mães dos outros: 'E aí, já ligou aí?', e ouvia como resposta: 'aqui já'. E lá em casa nada de tocar o telefone. Falei: 'Mano, não é possível. Não é possível'. Estava muito apreensivo.

Mas aí, o telefone tocou.

'Já pensei em parar'

Alves com a 8 do São Paulo - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Matheus Alves já foi camisa 5 e camisa 8 antes de virar 10 no São Paulo
Imagem: Reprodução/Instagram

Só que ser aprovado era só o primeiro o. Eu era muito franzino na época e os caras me atropelavam. Eu só tinha qualidade, mesmo, mas a força se sobressaía mais e, depois sub-11, eu não conseguia jogar.

Fui reserva até o sub-15, quando entrou o Menta (técnico). Ali, ele me deu a camisa 10 e eu fui muito bem.

Só que no primeiro ano de sub-20, quando eu tinha 18, fiquei o ano inteiro sem jogar. Foi difícil. É a idade primordial para o profissional. Estava muito triste, ligava para os meus pais todos os dias e pensava, sinceramente, em parar. "Quero sair, quero sair". Mas meu pai dizia: "Não, continua, vai dar certo".

Foi quando teve uma viagem para a Itália com os jogadores que não disputariam a Copinha. Fui titular nos cinco amistosos. Ali, falei pra mim mesmo: é a hora de mostrar.

E foi ali que viram que eu tinha que jogar.

Voltei bem falado porque os diretores também foram na viagem. Fomos para Dallas depois, fui titular e desempenhei bem. Quando voltamos, me tornei titular no Brasileiro e dali pra frente foi só sucesso.

O sonho da 10

Alves com a 10 - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Matheus Alves sonha vestir a camisa 10 do São Paulo também no profissional
Imagem: Reprodução/Instagram

Eu cheguei no São Paulo bem longe da posição em que atuo hoje. No sub-17, fui cabeça de área. Camisa 5, marcador marcador marcador. Depois, subi uma posição e fui para 8. Fiquei um bom tempo jogando ali, mas o Boer saiu, foi para o Santos (que ironia), e ali comecei a jogar mais adiantado e mostrei minhas qualidades.

Sabe, quando me chamaram de peladeiro lá em Santos, eu nunca abandonei aquilo que eu fazia. Vim para o campo e trouxe tudo isso comigo. Hoje, carrego como uma das minhas qualidades.

Se você me perguntar, claro que aquela assistência para o André Silva contra o Santos teve um gostinho especial. É óbvio que sim. E é engraçado que, desde a base, sempre contra o Santos parece que eu invoco alguma coisa: ou faço gol, ou dou assistência, ou sou o melhor da partida.

E dessa vez, agora no profissional do São Paulo, não foi diferente. Hoje, minha cabeça está 100% no São Paulo e quero deixar meu gol aqui. Tenho muito para viver com essa camisa e vou sempre dar a vida dentro de campo. Acho que quando eu balançar as redes, minha comemoração vai ser igual a do Ferreira: 15 comemorações na mesma (risos).

Se eu tivesse que projetar meu futuro, daqui cinco anos eu espero estar muito firmado aqui no São Paulo, sendo titular e com muitos títulos. Ah, e um dia quero vestir a camisa 10 do São Paulo. É o meu maior sonho.

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