Briga pelo brega no Congresso: Recife e Belém disputam ser 'berço' do ritmo

As cidades de Belém e Recife disputam, no Congresso Nacional, o título de "Capital Nacional do Brega" e o reconhecimento como berços do ritmo.
O que aconteceu
Comissão de Educação e Cultura do Senado aprovou PL (projeto de lei) que deu a Recife o título de Capital Nacional do Brega. O relator do projeto, senador Humberto Costa (PT-PE), destacou os elos do ritmo à capital pernambucana ao comemorar a aprovação.
De fato, Recife é uma cidade onde o brega é, além de tudo, uma atividade econômica relevante. Vale lembrar que o brega foi uma manifestação cultural muito forte inclusive durante a ditadura militar, quando esse movimento falava para uma população importante, que era o das pessoas oprimidas socialmente. Foi uma forma de resistência, na qual temas que eram tabus eram abordados. Então esse projeto é uma homenagem a esse tema musical, que cumpriu também um papel de resistência. Humberto Costa, em entrevista à agência Senado
A decisão, tomada no último dia 13 de maio, contrariou belenenses e nomes do ritmo do Pará. Eles vieram a público protestar contra o PL n° 2521/2021.
No Senado, a disputa ainda não chegou ao fim. O senador Beto Faro (PT-PA) encaminhou um recurso para que o projeto fosse avaliado pelo plenário e questiona os méritos de Recife para receber a homenagem.
Segundo o texto, o projeto desobedece à lei 14.959/2024, que estabelece critérios mínimos para os títulos de Capital Nacional. Entre eles está uma manifestação da Câmara Municipal que demonstre o apoio do município à homenagem e os seus possíveis benefícios para a cidade. O senador afirma que não houve comprovação de consulta ou audiência pública.
Para Faro, não é o brega que domina o Recife, mas sim outros ritmos mais reconhecidamente pernambucanos. "Não há equivalência com a identificação daquela capital como berço de grandes manifestações culturais, a exemplo o Frevo e do Maracatu", argumenta o parlamentar.
O recurso cita ainda que, desde 2021, o brega é reconhecido no Pará em lei como Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado. Por isso, a solução proposta por Faro seria que o título fosse compartilhado entre as duas cidades. Splash entrou em contato com a assessoria do senador para ouvi-lo a respeito da sugestão, mas, até o momento, ele não se pronunciou a respeito. A reportagem será atualizada em caso de manifestação.
Artistas paraenses protestam
O DJ Dinho, da aparelhagem Tupinambá, afirma que o ritmo nasceu no seu estado e foi levado posteriormente a Pernambuco. Em vídeo, ele cita uma conversa que teria tido com Reginaldo Rossi em 1989, em que o cantor, já falecido, teria itido que o público paraense daria mais valor ao seu trabalho que o pernambucano.
Outros músicos paraenses defendem datas diferentes para a difusão do brega em Belém, citando as décadas de 1950 a 1990. O cantor e produtor Kim Marques diz acreditar em "valorização demagógica" do ritmo no Pará, que seria instrumentalizado por lideranças apenas quando há disposição para criar um canal com o público local. Para ele, o título ter sido dado a Recife é resultado natural da falta de valorização do enorme apelo que o ritmo já possui no Pará.
A gente sempre é procurado na hora que há uma necessidade real de ter uma ligação direta com o povo. Você quer falar com o povo e chama um cantor de brega, mas na hora de dar valor, na hora de realmente ver o quanto o brega sempre teve respeito pelo povo, sempre teve carinho pelo povo, é muito difícil. Kim Marques, cantor e produtor de brega
O brega é um ritmo de letras românticas e harmonias que lembram o bolero e o samba-canção que foi ganhando variantes regionais desde a década de 60. No Pará, por exemplo, é bastante popular o tecnobrega, que incorpora melodias eletrônicas às canções e foi popularizado para o restante do Brasil por artistas como Joelma e a banda Calypso, e a cantora Gaby Amarantos.
Este não é o primeiro reconhecimento dado ao brega no estado de Pernambuco, de Reginaldo Rossi a Augusto César. O movimento foi declarado Expressão Cultural Pernambucana e Patrimônio Cultural Imaterial do Município de Recife em 2021 pelo prefeito João Campos (PSB). Ao defender o título de Capital Nacional do Brega para Recife, o relator Humberto Costa justificou que o conceder é "reconhecer o esforço do município na promoção de um gênero que muito representa seu povo e toda a população brasileira".
Em abril, a mesma comissão do Senado aprovou o PL 5.616/2023, criado pelo deputado Pedro Campos, irmão do prefeito recifense, que estabelece o dia 14 de fevereiro como Dia Nacional do Brega. A data era o aniversário do cantor Reginaldo Rossi, pernambucano tido como "rei do brega". Atualmente, o texto aguarda sanção do presidente Lula.