Haddad manda recado ao mercado ao culpar Congresso e Justiça por rombo

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, distribuiu recados na entrevista coletiva que na quinta-feira (22) anunciou o congelamento de R$ 31,3 bilhões do Orçamento.
Ele criticou decisões da Justiça que aumentam as despesas do governo, culpou o Congresso por manter concessões fiscais a empresas, avisou ao mercado financeiro que o presidente Lula (PT) e a equipe econômica são rigorosos com a responsabilidade fiscal e fez um aceno ao eleitorado petista: nenhum ajuste vai prejudicar quem é pobre.
Veja os recados de Haddad:
Judiciário aumenta rombo
Haddad criticou as liminares que concedem na Justiça o Benefício de Prestação Continuada. O BPC dá um salário mínimo a pessoas com deficiência e idosos de baixa renda. O ano ado registrou o maior volume de novas concessões por determinação judicial da história: 182 mil novos beneficiários, 23% do total, revelou O Estado de S. Paulo. Em 2024, o benefício custou R$ 91 bilhões à Previdência Social.
[O BPC] É um programa que está com um alto índice de judicialização. É uma coisa que não está na competência exclusiva do Poder Executivo; está com uma dinâmica que está extrapolando o Poder Executivo, que tem regras de concessão do benefício na forma da Constituição.
Fernando Haddad, ministro da Fazenda
Muitas vezes, uma liminar é o suficiente para incluir um beneficiário que nem sempre se enquadra exatamente nos critérios do programa.
Uma despesa que está, pela sua dinâmica, impedindo que as demais despesas corram na mesma velocidade.
São poucas as coisas que podem ser resolvidas istrativamente, sobretudo quando envolvem interpretação de lei, como é o caso de alguns problemas que nós estamos enfrentando.
Omissão do Congresso
Também sobrou para o Congresso. Haddad culpou o Parlamento por não aprovar medidas suficientes para cobrir a perda de arrecadação provocada pela prorrogação das desonerações fiscais para 17 setores da economia e pequenas cidades. O Congresso também manteve o Perse, desoneração de R$ 15 bilhões ao setor de eventos. Na mesma ocasião, o Senado revogou uma Medida Provisória que previa o fim gradual do programa.
R$ 20 bilhões de contingenciamento se devem ao fato de que algumas circunstâncias posteriores ao encaminhamento do Orçamento do ano ado. (...) O primeiro fato é que não houve a compensação (...). Havia uma determinação [do STF] de que se fizesse, e não foi feita.
Fernando Haddad
Essas três questões [desoneração da folha, a pequenas cidades e Perse] custaram R$ 45 bilhões aos cofres públicos. Se tivesse entrado no caixa, teríamos um superávit de R$ 35 bilhões no ano ado. Mas não foi o Executivo que produziu essa renúncia.
Fernando Haddad
Ele pediu empenho do Congresso na aprovação de leis que ajudem a cumprir a meta fiscal. Eles têm se mostrado aliados na hora de colocar os projetos da Fazenda em votação, mas também respondem a lobbies dos setores econômicos.
Tenho falado com o presidente [da Câmara] Hugo Mota, tenho falado com o presidente [do Senado] Davi Alcolumbre, todos se mostram solícitos em relação a isso.
Precisamos voltar a discutir determinadas regras, determinados procedimentos para ajudar no cumprimento da meta.
Precisamos de parceria para conseguir endereçar [os problemas], até por meio de aprovação de lei.
80% das vezes, nós [do governo] conseguimos achar um caminho. Em outros momentos, nós não achamos. Na questão da compensação, nós não encontramos o caminho.
A ministra Simone Tebet (Planejamento) também cobrou o Congresso. Ela disse que o governo propôs uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que dava mais poder ao Executivo para cortar gastos. "Isso não foi aprovado pelo Congresso", afirmou.
Tem algum Poder no país para nos ajudar a atingir essas metas?
Fernando Haddad
Nós dependemos da compreensão de mais atores, não é só o Executivo
Temos que ter uma agenda de Estado, uma agenda suprapartidária. Não adianta ser uma causa de um homem só, de um governo só.
Nós não estamos fazendo um ajuste fiscal que penaliza a camada mais pobre da população, que era a prática no Brasil. Nós estamos equilibrando as peças do orçamento de maneira a garantir melhor distribuição de renda, crescimento, melhores condições de cumprimento de meta fiscal, eficiência de mercado.
Haddad acalma e ironiza mercado
Após os recados ao Judiciário e ao Congresso, Haddad e Tebet tentaram acalmar o mercado financeiro. Os ministros frisaram que, sob a liderança de Lula, a equipe econômica tem compromisso com o equilibro das contas públicas.
O [cuidado com o] fiscal é diário. Não é um tema que aparece na minha mesa uma vez por semana. Aparece todo dia, e na mesa de todos os secretários.
Fernando Haddad
Na reunião com o presidente, houve um consenso sobre o que fazer com a participação de todos os ministros palacianos e a área econômica toda presente (...) O que o presidente decidiu, foi decidido de comum acordo.
Há um dever de casa que o Ministério do Planejamento está fazendo com o apoio de todos os ministérios e com o apoio do presidente Lula, de revisão de gastos. Ela [revisão] ainda continua em relação a erros, fraudes, visando efetivamente a eficiência dos gastos.
Simone Tebet
Com um pouco de ironia, Haddad elogiou a pressão do mercado. "Fico feliz de o mercado estar preocupado com 2027, porque até o ano ado estava preocupado com 2024", disse ele ao ser questionado sobre o fato de o mercado questionar o equilibro das contas no primeiro ano de mandato do próximo presidente.
Quem sabe o ano que vem eles estejam preocupados com 2030. Seria o melhor dos mundos. Quanto mais a gente oferecer horizonte para as pessoas perceberem que o Brasil está no caminho certo, melhor.
Fernando Haddad
Quanto mais longe o mercado estiver enxergando, melhor.
Recado a Renan Filho
Haddad também alfinetou Renan Filho. O ministro dos Transportes informou sobre o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) antes do anúncio oficial. Enquanto Haddad explicava o congelamento de gastos, jornalistas pediram detalhes sobre o aumento do imposto, revelado minutos antes por Renan. Haddad se recusou a falar sobre o tema porque ele seria discutido em coletiva que viria em seguida, mas lançou indireta ao colega de Esplanada.
Veja bem, olha a nossa posição. Nossa posição é a seguinte: seguir um protocolo. Se alguém não seguiu, o problema é dessa pessoa.
Fernando Haddad
No dia seguinte, Haddad recuou sobre a cobrança de IOF. Ele voltou atrás em regras para investimentos de fundos no exterior. "No conjunto do que foi anunciado, está tudo mantido, mas esse item foi revisto", declarou Haddad pela manhã, antes da abertura do mercado financeiro. O objetivo era "evitar um tipo de boataria, especulação em torno de objetivos que o governo não tem efetivamente" e ar "uma mensagem equivocada".