Em Paris, Gilmar Mendes defende regulação das redes sociais e critica modelo atual: "Envelheceu"
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou que o artigo 19 do Marco Civil da Internet precisa ser revisto diante dos desafios contemporâneos impostos pelas plataformas digitais. O magistrado defendeu, em entrevista à Rádio França Internacional (RFI), uma maior responsabilização das redes sociais e destacou a necessidade de o Brasil se inspirar em legislações europeias para enfrentar a desinformação e proteger a democracia.
Nesta quarta-feira (4), o STF retoma o julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que estabelece que conteúdos só podem ser removidos mediante ordem judicial. Para Gilmar Mendes, essa regra já não responde aos desafios atuais.
"Esse modelo, de 2012, 2014, quando se falava na neutralidade das plataformas, envelheceu. Ele cumpriu uma função importante, mas hoje estamos sofrendo as distorções diante da evolução das redes e dos problemas que enfrentamos, como fake news e ameaças à própria democracia", afirmou.
O ministro fez uma palestra na segunda-feira (2) no Seminário franco-Brasileiro de Rádio e Televisão organizado pela ABERT (Associação Brasileira de Rádio e Televisão) na Embaixada do Brasil em Paris, onde destacou a necessidade da regulação das redes sociais, o que não significa, segundo o decano, comprometer a liberdade de expressão.
"Regular as redes sociais não é tolher, ou de qualquer forma mitigar o direito fundamental à liberdade de expressão", declarou no evento. Gilmar Mendes estacou que o tribunal caminha para uma interpretação que permita a retirada de conteúdos mediante simples notificação às plataformas, sem necessidade de decisão judicial. "É uma mudança significativa no caminho de uma maior responsabilização das plataformas", explicou.
Brasil é exemplo
Durante a entrevista à RFI, Gilmar Mendes também criticou o modelo de negócios das redes sociais, que, segundo ele, se alimenta da polarização e da desinformação. "As plataformas têm sucesso com a conflituosidade. Notícias factuais não geram engajamento. O que gera engajamento são matérias polêmicas, muitas vezes falsas. Isso está ligado à monetização", disse.
Ele defendeu que o Brasil siga o exemplo de países como França, Alemanha e Reino Unido, que já adotaram legislações mais rígidas. "As fake news não são um problema brasileiro, nós vimos inclusive nos debates as revelações de manipulações, inclusive com inteligência artificial", afirmou. Para o decano do STF, o Brasil deve servir de exemplo, fazendo referência aos ataques de 08 de janeiro e um sistema de propagação de desinformação adotado no governo anterior. "Tivemos abuso, um governo que abusou das fake news, tinha lá o tal 'gabinete do ódio'. As instituições se mostraram resilientes, mas nós temos consciência de que precisamos fazer uma boa regulação e, claro, temos muito a aprender com os avanços que já se detectam na Europa", concluiu.