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'Lúcifer é luz': como foi o casamento 'luciferiano' com noivos de vermelho

do UOL

Maurício Businari

Colaboração para o UOL

27/05/2025 05h30

Cavalo, liteira vermelha, louvores a uma deusa e juramentos diante de um altar decorado: assim foi realizado, em Itatiaia (RJ), um casamento luciferiano —considerado o primeiro do Brasil— em uma igreja dedicada a Lúcifer.

Como foi o casamento

O casamento viralizou em vídeos publicados nas redes sociais. Ele foi conduzido por Jonathan de Oliveira Ribeiro, 31, conhecido como Mestre Jonan, e por sua esposa, Lídia Almeida Oliveira, 25, que também atua como sacerdotisa na igreja. A cerimônia ocorreu no fim de março e voltou a repercutir agora.

O vermelho dominou cada detalhe da cerimônia: o tapete que levava ao altar, os trajes dos convidados, as flores e os paramentos dos membros da igreja.

O noivo a cavalo e a noiva em uma liteira vermelha abriram a cerimônia com cenas coreografadas e simbólicas. Pedro, o noivo, entrou na igreja montado em um cavalo malhado, vestindo terno e calça vermelhos. Franciane, a noiva, foi anunciada por um trompetista e entrou na igreja carregada em uma liteira.

Após a liteira ser baixada, a noiva seguiu até o altar acompanhada da mãe, que vestia azul. Nas mãos, levava um buquê de rosas vermelhas e brancas. À frente, uma daminha de honra espalhava pétalas sobre o tapete. Um menino trouxe as alianças. Durante a celebração, duas mulheres dançaram em torno do casal, jogando pétalas sobre eles.

A cerimônia terminou com um beijo, aplausos e louvores à deusa Astaroth. Segundo Mestre Jonan, Astaroth representa o amor e o sagrado feminino. Por isso, os tons de vermelho. "Foi tudo autorizado pela espiritualidade", afirmou ao UOL.

Uma cerimônia linda, respeitosa, feita com justiça e luz. Esse foi o primeiro casamento luciferiano registrado oficialmente no Brasil. Mestre Jonan

Jonan explicou que esse tipo de cerimônia segue uma ritualística própria, com o uso da água como elemento de purificação. Durante o rito, o casal também recebe uma árvore simbólica para plantarem juntos —gesto que representa o fortalecimento da relação à medida que ela cresce e cria raízes.

Durante a cerimônia, os noivos assumem compromissos de amor, fidelidade, respeito, compaixão e equilíbrio. Eles também am a seguir os dez mandamentos da igreja, cujo conteúdo é aos membros e visa formar indivíduos com princípios morais e atitudes benevolentes.

Franciane e Pedro durante a cerimônia, marcada por votos de fé e espiritualidade - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Franciane e Pedro durante a cerimônia, marcada por votos de fé e espiritualidade
Imagem: Arquivo Pessoal

Lúcifer não é o diabo

Segundo os sacerdotes e participantes, engana-se quem confunde a cerimônia com algum tipo de ritual satânico. Para os fiéis da Primeira Igreja Luciferiana do Brasil, Lúcifer não é o diabo —e o culto a ele não tem relação com o satanismo tradicional. "O satanismo existe como forma de protesto. É algo muito mais arquetípico e social. O que vivemos aqui é espiritualidade", explicou o sacerdote.

Para Jonan, o luciferianismo defende o equilíbrio, a sabedoria e a libertação da ignorância —e reconhece a existência de um Deus criador. "Lúcifer é luz. É a energia que ilumina o caminho para nos tornarmos dignos de sermos filhos de Deus", disse. Ele também critica a ideia de responsabilizar o "diabo" pelos próprios erros. "Acreditar no diabo é acreditar em um culpado. É tirar de si a responsabilidade. Nós é que mentimos, matamos, roubamos. Não Lúcifer."

Fé como palavra-chave

Franciane Palmeira, 30, é secretária, e Pedro Antônio, 24, auxiliar de logística. Ambos são de Volta Redonda (RJ). O casal se conheceu na casa de Jonan e é frequentador da igreja. "Foi uma escolha por afinidade", disse Franciane ao UOL. "A ligação com a espiritualidade da casa é muito forte no nosso relacionamento. O casamento veio através deles."

Segundo Franciane, o casamento foi a realização de um sonho espiritual e afetivo. Ela descreve a cerimônia como um momento de profunda conexão e dever cumprido, marcado pela presença das entidades que acompanham o casal desde o início da relação. Embora reconheça que o luciferianismo possa causar estranhamento, afirma que não enfrentou preconceito —e que, mesmo se houvesse, isso não abalaria sua fé.

Para a noiva, a força da espiritualidade sempre foi maior que a opinião alheia. "Minha mãe estava presente. A mãe do Pedro também. Minha irmã, o irmão dele, sobrinhas. Todos sabiam da importância da espiritualidade na nossa vida."

Fachada, altar e representação de Lúcifer na Primeira Igreja Luciferiana do Brasil, em Itatiaia (RJ) - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Fachada, altar e representação de Lúcifer na Primeira Igreja Luciferiana do Brasil, em Itatiaia (RJ)
Imagem: Arquivo Pessoal

Chamado espiritual

A Primeira Igreja Luciferiana do Brasil foi inaugurada em março de 2024, em Itatiaia (RJ), às margens da Rodovia Presidente Dutra. Com fachada neogótica rubro-negra e uma cruz invertida na entrada, a igreja chama a atenção de quem a pela rodovia. A estrutura foi erguida ao lado da residência de Jonan, que já mantinha centros espirituais na região.

Segundo ele, a fundação da igreja foi um chamado espiritual. "Tanto a construção da igreja quanto o casamento luciferiano foram pedidos dos guias espirituais", afirmou. Jonan diz que buscou criar um espaço para quem não se identifica com religiões tradicionais, unindo espiritualidade, justiça e estética simbólica, com elementos da quimbanda, uma religião de matriz africana.

Fiz um casamento tão bonito, tão bonito, que até mesmo aquelas pessoas que são negativas e gostam de atacar a fé alheia se calaram.
Mestre Jonan

A recepção na comunidade também foi tranquila, segundo o sacerdote. "Já tive centro aqui antes, sou conhecido no bairro. Sempre fiz projetos sociais. As pessoas me respeitam."

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